Resposta ao artigo “Professores, acordem!”, de Gustavo Ioschpe, publicado na revista Veja n° 2373, de 14 de maio de 2014.
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Publicado em Segunda, 09 Junho 2014 às 16:30
O texto redigido por este destacado escritor é lido por grande parte dos cidadãos brasileiros, em virtude do direito cativo que esta revista semanal já conquistou.
O conteúdo cumpre o seu direito constitucional de informar um conjunto de ideias; porém, se tiver o objetivo de colocar a sociedade em lado oposto ao professor, não terá a garantia de sucesso. Todos os brasileiros, sem exceção, já dependeram, direta ou indiretamente, do trabalho de um professor. Todos conhecem as deficiências da escola, conhecem também os avanços alcançados ao longo dos anos. A escola pública de hoje não é a do início do século passado. Tudo mudou: ela é universal, todos sabem, todos veem, todos acompanham - inclusive os burgueses.
Não posso contestar a visão caricata e rotulada a respeito do educador, pois é a forma como enxerga esse articulista. O ponto de vista não é o único problema da educação. O povo brasileiro já tornou público os seus desejos, quando em junho de 2013 foi para as ruas, clamando por educação, saúde e segurança em um padrão avançado. Padrão FIFA.
O Brasil investe 5,5% do PIB (Produto Interno Bruto) em educação - abaixo dos 6,23% que recomenda a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), no relatório sobre a educação divulgado pelo órgão em 2012. Portanto, não dá para comparar com o percentual dos países desenvolvidos como Japão ou Suíça. O PNE (Plano Nacional de Educação), que está para ser votado na Câmara, estabelece um percentual de 10% até o ano de 2022. A meta 17 do plano prevê a valorização do professor. A imprensa poderá contribuir com este avanço.
A preocupação deste autor com os movimentos paredistas deveria ter a mesma alegação com as formas variadas que outros trabalhadores ou classes dominantes da elite usam para vencer as barreiras que impedem a justiça social. Não é possível entender como coerente nivelar o salário por baixo, comparando o salário de um professor cubano com o de um professor brasileiro. Médicos cubanos povoam o mundo; todos os médicos um dia foram alunos e dependeram de um professor.
Lamento que o profeta do apocalipse use a filosofia Jeca-Tatu (personagem histórico do escritor Monteiro Lobato): “Não adianta mais dinheiro! Não adianta mais investimento! Nada vai mudar!”. Isso é pessimismo. O autor é leviano quando tenta vincular os investimentos em educação com impacto direto na remuneração do professor, como se toda a verba fosse empregada em salários. Ao invés de desqualificar a luta por valorização do professor, melhor faria o estudioso se levantasse a discussão sobre a correta aplicação dos recursos da educação.
Diferente do que diz Ioschpe, não nos colocamos como coitadinhos, ao contrário, fomos e somos protagonistas dos principais avanços da educação brasileira, como a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação); o Fundeb (Fundo de Desenvolvimento e Manutenção da Educação Básica); a Lei do Piso Salarial Profissional Nacional do Magistério - que estabelece, além de um valor mínimo abaixo do qual nenhum professor deve receber, a destinação de 1/3 da jornada do educador para o planejamento de atividades. Lutamos também por melhorias tão fundamentais para a valorização da nossa profissão, quanto o salário: escolas mais estruturadas; menos alunos por sala de aula; ingresso na carreira por meio de concurso público, etc. Os professores de todo o Brasil já testemunharam mudanças e cremos no futuro, cremos em um mundo mais justo e melhor.
Gostaria de entender ainda, de qual país o autor está falando quando diz que não há exigência de contrapartida dos professores, por meio de seu trabalho, aos investimentos feitos na educação. O que são as metas que cada escola tem de cumprir no IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), senão cobranças de um bom trabalho dos profissionais da educação?
É descabido reduzir a luta por valorização do professor à ganância. Uma vez que a Meta 17 do PNE estabelece igualar a média salarial dos professores licenciados à média dos demais profissionais com nível superior. Atualmente, o educador brasileiro ganha 40% menos do que outros trabalhadores com a mesma formação. O magistério não é um sacerdócio, um ato de heroísmo; é uma profissão muito importante para o desenvolvimento da sociedade brasileira.
Desta forma, os trabalhadores gostariam de sentir um escritor intrépido e lutando por: mais recursos públicos para a educação e sua justa aplicação; melhores condições de trabalho para os professores; apoio às famílias cujos filhos frequentam a escola pública; menor diferença de renda entre os burgueses e os trabalhadores; uma página semanal da revista Veja apontando as experiências bem sucedidas na educação pública em todo Brasil.
Geraldo Alves Gonçalves
Presidente ACP (Sindicato Campo-grandense dos Profissionais da Educação Pública)
Licenciado em Língua Portuguesa e Pedagogia
Pós-graduado em Metodologia do Ensino Superior
Fonte: Revista Veja
Kalyne Cunha
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